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  • Denise Evangelista

APLICAÇÃO DA TEORIA DO PROPOSITO NEGOCIAL E O PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO

Atualizado: 20 de dez. de 2019

NECESSIDADE DA MUDANÇA DO PARADIGMA ATUAL

(In Observatório Permanente do CARF – Migalhas 24/03/2017)





1.    INTRODUÇÃO

Tempos de crise econômica evidenciam a necessidade do empresário buscar meios para amenizar os efeitos negativos, por vezes devastadores, da alta carga tributária. Entretanto, a motivação para desonerar o passivo tributário empresarial transcende o estado econômico do País, e acompanha diversas medidas para se maximizar os resultados durante o processo de maturação empresarial.

À luz dessa ótica o Planejamento Tributário ganha notoriedade, considerando sua eficácia em ajudar a empresa prosperar a no mercado. Assim, a habilidade de propor medidas legais, para ajuste contábil dentro do planejamento tributário, é o diferencial necessário para se chegar aos resultados propostos.


O grande problema do Planejamento Tributário, é a linha tênue do entendimento do Fisco entre a legalidade e a ilegalidade das medidas adotadas para desonerar o passivo tributário da empresa. Por tal razão, a autuação por “planejamento tributário abusivo” é a medida mais comum imposta pelo Ente Fiscal, assentado em um entendimento de que as medidas adotadas pela empresa com o fim de desonerar seu passivo tributário, deve prevalecer o chamado “Propósito Negocial”.  


Para Ricardo Lobo Torres só a elisão abusiva ou o planejamento inconsistente se tornam ilícitos:   


“O problema da elisão fiscal está intimamente ligado ao das posições teóricas fundamentais em torno da interpretação do direito tributário."


O positivismo normativista e conceptualista defende, com base na autonomia da vontade, a possibilidade ilimitada de planejamento fiscal. A elisão, partindo de instrumentos jurídicos válidos, seria sempre lícita. Essa posição foi defendida com veemência por Sampaio Dória.


 O positivismo sociológico e historicista, com a sua consideração econômica do fato gerador, chega à conclusão oposta, defendendo a ilicitude generalizada da elisão, que representaria abuso da forma jurídica escolhida pelo contribuinte para revestir juridicamente o seu negócio jurídico ou a sua empresa. Amilcar de Araújo Falcão representou moderadamente no Brasil essa orientação.


A jurisprudência dos valores e o pós-positivismo aceitam o planejamento fiscal como forma de economizar imposto, desde que não haja abuso de direito. Só a elisão abusiva ou o planejamento inconsistente se tornam ilícitos.


Autores de prestígio como K. Tipke, K. Vogel e Rosembuj defendem esse ponto de vista. Entre nós alguns trabalhos recentes de Marco Aurelio Greco e de Hermes Marcelo Huck também admitem o controle nos casos de abuso de direito.[1]


A abordagem do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF segue a mesma linha, acrescentando ao entendimento do fisco, que o interesse coletivo deve prevalecer sobre o direito fundamental da autonomia privada consagrada no artigo 3º na Constituição Federal, daí a importância dada à necessidade do “propósito negocial” na validação ou não do ato objeto de autuação.


2.    REFLEXÕES SOBRE PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO


O exame conceitual de planejamento tributário, institivamente nos remete à possibilidade legal da empresa se organizar, ancorada no direito ao livre exercício da atividade econômica, previsto no artigo 170 da Magna Carta, bem como no direito à livre iniciativa, valor incrustado no artigo 3º da CF/88, objetivando a maior exoneração tributária possível.

Ivo Cesar Barreto de Carvalho[2] simplifica o conceito, professando que: “O planejamento tributário é a atividade desenvolvida por pessoa física ou jurídica, pública ou privada, de forma estritamente preventiva e transparente, a fim de alcançar licitamente a economia tributária”.        


Merece destaque também a destinação do termo “Planejamento Tributário”, dado por José Eduardo Soares de Melo[3], assim definindo: “O planejamento tributário deve constituir constante e natural preocupação das pessoas naturais e jurídicas de direito privado, que se sentem sufocadas pelos inúmeros encargos tributários afetos aos seus patrimônios, que impedem o desenvolvimento (ates mesmo a sobrevivência) pessoal, empresarial, econômica e a livre iniciativa (CF, arts. 3º, II e 170, IV, e parágrafo único), comprometendo a capacidade contributiva (CF, art. 145, §1º) e a dignidade humana (CF, arts. 1º, III, e 170, caput)”.   


Na prática, esse conceito foi subvertido com o advento do Parágrafo Único do Artigo 116 do CTN, introduzido pela LC nº 104/2001, in verbis, pois introduziu regra que autoriza a administração pública, munida de interpretações subjetivas, a desconsiderar os efeitos do planejamento tributário, ao argumento da contrariedade à lei do ato.   

       

Art. 116. Salvo disposição de lei em contrário, considera-se ocorrido o fato gerador e existentes os seus efeitos:


(...)

Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)


Assim, adotou o conceito de Proposito Negocial como um dos pilares conceituais para se inferir a legalidade do ato praticado pela empresa no planejamento tributário, dando nova dinâmica à utilização do termo.


3.    NATUREZA JURÍDICA DO PROPÓSITO NEGOCIAL


O termo Proposito Negocial surgiu no julgamento do famosos caso Gregory vs Helvering no ano de 1934, pela Suprema Corte dos Estados Unidos. O relato do evento que originou a ação, contido nos autos do processo, que é público, portanto, aberto para a consulta, narra que a Sra. Evelyn Gregory era detentora do capital social da empresa United Mortgage Corporation (UMC), que por sua vez, mantinha em seu patrimônio 1.000 (mil) ações da empresa Monitor Securities Corporation (MSC).


Assim, com objetivando vender as ações da MSC com custo tributário mais atraente, a Senhora Gregory optou por realizar uma reorganização societária, transferindo as ações da referida empresa do capital social da UMC para seu patrimônio pessoal, antes de oferece-las ao mercado.


Em artigo publicado na revista dialética de direito tributário[4], Ramon Tomazela Santos, relata com riqueza de detalhes a dinâmica da reorganização empresarial adotada pela Sra. Gregory, a fim de obter o resultado desejado, bem como a interpretação do judiciário após autuação fiscal, originando, a teoria do propósito negocial, vejamos;


“Para atingir esse objetivo, a Sra. Gregory constituiu, em 18 de setembro de 1928, a Averill Corporation (AC), organizada sob as leis de Delaware. Em seguida, a UMC transferiu as 1000 ações que detinha na MSC para essa nova sociedade recém constituída (AC), que, em contrapartida às ações recebidas em aumento de capital, emitiu novas ações subscritadas pela Sra. Gregory. Em 24 de setembro de 1928, a AC foi dissolvida e liquidada, com a consequente entrega de todo seu patrimônio, que era composto pelas ações da MSC, para a Sra. Gregory."


Em seguida, a Sra. Gregory alienou as ações da AC por U$$ 133.333,33, oferecendo à tributação, a título de ganho de capital, o valor de U$$ 76.007,88, correspondente à diferença entre o preço de venda e o custo de aquisição de U$$ 57.325,45.


Ao examinar a operação, o agente fiscal da Receita Federal dos Estados Unidos, Sr. Guy Helvering, considerou que a reorganização societária realizada pela Sra. Gregory deveria ser desconsiderada, pois seu único objetivo seria evitar o imposto de renda incidente sobre os dividendos que seriam distribuídos pela UMC, em caso de alienação direta das ações da MSC. Assim, na visão da autoridade fiscal, caso a UMC tivesse realizado diretamente a venda das ações da MSC e, em seguida, distribuído o resultado obtido com essa alienação como dividendos, a Sra. Gregory teria suportado uma carga tributária muito superior ao valor de U$$ 76.007,88 efetivamente recolhido ao Fisco.


Inconformada, a Sra. Gregory decidiu discutir judicialmente a validade da autuação fiscal. Em primeiro grau de jurisdição, o Conselho de Autuações Fiscais (Board of Tax Appeals) proferiu uma decisão favorável à contribuinte, cancelando a exigência fiscal de imposto de renda, com base no argumento a seguir reproduzido:


“As long as corpotations are recognized before the law as if the they were creatures of substance, there is nothing to distinguish [the newy-formed Corporation] from immumerable others, whether they be divised to achieve a temporary tax reduction or some others legitimate end. Congress has not left to the commissioner to say (...) that the corporate form may be ignored in some cases and reorgnized in others. (...) A statute so meticulously drafted must be interpreted as a liberal expression. Of the taxing police, and leaves only the small interstices for judicial consideration.”


Vê-se que, para cancelar a autuação fiscal, a decisão parte do pressuposto que as pessoas jurídicas são criaturas criadas pela ordem jurídica[5], de modo que não razão para distinguir uma sociedade recém-constituída das demais[6] , ainda que o único proposito seja a obtenção de redução de tributos ou qualquer outra finalidade legitima. Na visão dos julgadores, o agente fiscal não pode decidir, a seu talante, quando a personalidade jurídica será considerada válida para todos os efeitos jurídicos e quando o véu da personalidade jurídica será descortinado, para alcançar seus sócios.


Porém, essa decisão foi revertida pela Corte de Apelação do 2º Circuito nos Estados Unidos, com base no clássico voto proferido pelo juiz Learned Hand, que pode ser considerado o precursor da teoria do propósito negocial, pelo menos em sua concepção original.


Em seu voto condutor, o juiz Learned Hand registrou que o contribuinte tem o direito de organizar seus interesses de modo a suportar a menor carga tributária possível. Afinal, o contribuinte não é obrigado a escolher a alternativa que conduza ao maior recolhimento de tributos ao Poder Público, pois não há um dever patriótico de aumentar os tributos devidos ao Estado em cada fato gerador[7]. Porém, o ilustre magistrado consignou que esse direito à economia lícita de tributos não implica o reconhecimento de que o Congresso dos Estados Unidos decidiu resguardar os atos ou negócios jurídicos praticados por Evelyn Gregory, pois a regra jurídica em debate não poderia ser interpretada apenas literalmente, devendo ser compreendida à luz de sua finalidade. Por isso, Learned Hand considerou que os arranjos societários praticados pela Sra. Gregory para a venda das ações da MSC não se enquadravam no conceito de “reorganização societária” que a lei pretendeu acolher, por não estarem inseridos na condução dos negócios ou das atividades econômicas de quaisquer das sociedades evolvidas.


Posteriormente, o caso foi submetido à Suprema Corte dos Estados Unidos, que manteve a decisão proferida pelo Juiz Learned Hand, consagrando, em caráter definitivo, o embrião o embrião da teoria do propósito negocial. Desde então, a concepção original desenvolvida por Learned Hand vem sendo invocada por diversas decisões administrativas e judiciais ao redor do mundo, ainda que sem uma análise detida do seu contexto original”. (...)


A análise profunda da origem da teoria do propósito negocial, é de suma importância para sua aplicação, quando tem por objetivo A desconstituição de quaisquer atos de organização empresarial no curso do planejamento tributário, já que o controle exacerbado do Estado perante às empresas que buscam a redução da carga tributária de forma licita, prejudica a economia, e, por consequência a arrecadação.


Por tal razão, o estudo da utilização da teoria do proposito negocial no âmbito dos julgados do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF por parte dos julgadores, mostra-se necessário para demonstrar a qualidade dos argumentos que estribam tais decisões.


4.    A APLICAÇÃO DA TEORIA DO PROPOSITO NEGOCIAL PELO CARF


Municiado pelos termos do Parágrafo Único do Artigo 116 do CTN, introduzido pela LC nº 104/2001, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais possuí reiteradas decisões no sentido de desconsiderar a operação de planejamento tributário, pela ausência de “proposito negocial”.


Em diversas situações, o tribunal administrativo inclusive mantém multa de oficio qualificada, por entender que houve fraude ou simulação na reorganização societária, pela ausência de proposito negocial.  


Como exemplo, temos a recente jurisprudência in verbis, onde houve negativa de seguimento do Recurso Especial interposto pelo Contribuinte, onde rejeita em nome de uma “justiça social” a reorganização societária sem o proposito negocial;


Assunto: Normas Gerais de Direito Tributário

Ano-calendário: 2006, 2008


OPERAÇÕES DE REORGANIZAÇÃO SOCIETÁRIA. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS. FALTA DE PROPÓSITO NEGOCIAL. INADMISSIBILIDADE.


Não se pode admitir, à luz dos princípios constitucionais e legais - entre eles os da função social da propriedade e do contrato e da conformidade da ordem econômica aos ditames da justiça social -, que, a prática de operações de reorganização societária, seja aceita para fins tributários, pelo só fato de que há, do ponto de vista formal, lisura per se dos atos quando analisados individualmente, ainda que sem propósito negocial.

GANHO DE CAPITAL. CONSTITUIÇÃO DE SOCIEDADE SEM PROPÓSITO NEGOCIAL. PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO ABUSIVO.


O sólido e convergente acervo probatório produzido nos autos demonstra que o contribuinte valeu-se da criação de uma sociedade, para a alienação de bens classificados em seu ativo permanente, evadindo-se da devida apuração do respectivo ganho de capital, por meio de simulação, que é reforçada pela ausência propósito negocial para sua realização.


MULTA DE OFÍCIO QUALIFICADA. SIMULAÇÃO.


Comprovadas a simulação e o intuito fraudulento, caracterizado pelo dolo específico, impõe-se a aplicação da multa de 150%.

Recurso Especial do Contribuinte Negado. (Grifou-se – CSRF - Acórdão nº 9101-002.429 – PA nº 11080.723307/2012-06 – Rel. Marcos Aurélio Pereira Valadão – Sessão 18/08/2016)


O voto do Ilustre Relator do processo supramencionado estribou a aplicação da teoria do proposito negocial da seguinte forma:

(...)

“É, pois, o interesse coletivo que impede que as empresas ajam, em seus negócios particulares, como se não pertencessem a uma coletividade, a uma comunidade, a um grupo social.


É bem verdade que, a se entender que eventual vantagem fiscal que se possa ter em razão de determinada estrutura de negócios seja impeditiva à realização do próprio negócio em si, terseia a invalidade, para fins tributários, de boa parte das incorporações, fusões e cisões que comumente ocorrem nas atividades empresariais (mas não é este o caso presente).

Isso porque é evidente que, para o emprego dessas operações de rearranjo societário, pelas empresas, são analisados, dentre outros aspectos, também o aspecto tributário.


Porém, o que não se pode admitir, à luz dos princípios constitucionais e legais acima expostos entre eles os da função social da propriedade e do contrato e da conformidade da ordem econômica aos ditames da justiça social —, é que, para a adoção dessas operações, seja analisado, única e exclusivamente, o seu aspecto tributário (falta de propósito negocial).” (grifamos)


Por outro lado, a adoção de operações de reorganização societária, pelas empresas, de forma a esconder, ou subtrair à incidência tributária, a verdadeira operação da qual resulta as operações, implica a consideração dessas operações como simuladas, com a consequente qualificação da multa de ofício aplicada.


Isso porque, não possuindo essas operações qualquer propósito negocial, configuram-se, antes, meros artifícios jurídicos, simples truques organizacionais, objetivando burlar a tributação, ao aparentarem conferir ou transmitir direitos a pessoas diversas (“empresas veículo”, “interpostas pessoas”, “testas de ferro”, “laranjas”, etc.) daquelas às quais realmente se conferem, ou transmitem, na precisa dicção do § 1º do art. 167 do Novo Código Civil, e dessa forma, impedindo ou retardando, total ou parcialmente, o conhecimento, por parte da autoridade fazendária, da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária principal, sua natureza ou circunstâncias materiais, ou das condições pessoais do contribuinte, suscetíveis de afetar a obrigação tributária principal ou o crédito tributário correspondente (art. 71 da Lei nº 4.502, de 30 de novembro de 1964). (Grifou-se)


Nota-se que em nenhum momento houve o cuidado de aplicar a teoria do proposito negocial segundo sua concepção original, como se já houvesse uma definição intrínseca autoaplicável em qualquer caso envolvendo planejamento tributário, conforme se verifica nos diversos julgados abaixo relacionados:


Ementa(s):

Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica - IRPJ

Ano-calendário: 2008, 2009, 2010, 2011, 2012 NULIDADE. FUNDAMENTOS DA MULTA QUALIFICADA. INOCORRÊNCIA.

(...)

ÁGIO INTERNO. ÁGIO DE SI MESMO. FALTA DE PROPÓSITO NEGOCIAL NA CRIAÇÃO DA RECORRENTE. ARTIFICIALIDADE.


Apesar de não ter havido configuração de empresa veículo, a Recorrente foi criada para gerar o ágio, pois a empresa incorporada por ela, ou mesmo a empresa uruguaia, poderia ter se tornado o tal Centro de Serviços Compartilhados. A criação da Recorrente no mesmo endereço da incorporada, com transferência de ativos, operações e funcionários desta para aquela, revela uma estratégia, sem propósito negocial, traçada para gerar a redução da tributação. (Grifou-se – 4ªC/1ªTO - Acórdão nº 1401-001.584 – PA nº 16561.720141/2013-50 – Rel. Marcos de Aguiar Villas Boas – Sessão 05/04/2016)

(...)

Ementa(s)

Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica - IRPJ

Ano-calendário: 2008

(...)

OPERAÇÕES. FALTA DE PROPÓSITO NEGOCIAL. INEFICÁCIA.

A prática de operações cuja única motivação consiste na criação artificial de condições para auferir-se vantagens tributárias não é oponível à Fazenda Pública.

(Grifou-se – 3ªC/2ªTO - Acórdão nº 1302-001.746 – PA nº 10480.726868/2012-83 – Rel. Edeli Pereira Bessa – Sessão 19/01/2016)


Merece igual destaque seguinte julgado, através do qual, afirma categoricamente que não há na legislação brasileira, regra que veda a realização de negócios que vislumbre a redução de carga tributária:


Ementa(s)

Assunto: Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica - IRPJ

Ano-calendário: 2007, 2008, 2009

ÁGIO. FUNDAMENTO LEGAL. REQUISITOS. AQUISIÇÃO DE INVESTIMENTOS EM PARTICIPAÇÕES SOCIETÁRIAS. AMORTIZAÇÃO.

(...)

PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO. PROPÓSITO NEGOCIAL. EMPRESA VEÍCULO.

Os dispositivos legais concernentes ao registro e amortização do ágio fiscal não vedam que as operações societárias sejam realizadas, única e exclusivamente, com fins ao aproveitamento do ágio. Bem como, nota-se que tal regra não está presente em nenhum outro dispositivo legal de nosso sistema jurídico, seja nacional ou federal. Neste tom, registra-se, nenhuma norma pátria veda que a realização de negócios tenha por finalidade a redução da carga tributária - de forma lícita. É o que se observa no §3o, art. 2o da Lei das SA, o qual dispõe que a companhia pode ter por objeto participar de outras sociedades (empresa veículo), também, como forma de beneficiar-se de incentivos fiscais. Some-se a tal assertiva o fato de que a contribuinte possuía motivação negocial, clara, posto que encontrava-se impedida, por regras da ANEEL, de realizar a incorporação diretamente. Motivo pelo qual se valeu de uma empresa veículo.

(...)

(Grifou-se – 3ªC/2ªTO - Acórdão nº 1302-001.978 – PA nº 19515.720386/2012-40 – Rel. Talita Pimenta Felix – Sessão 14/09/2016)


Considerando as diversas situações em que se utilizou a teoria do propósito negocial para desconsiderar a reorganização empresarial dentro de um planejamento tributário, a fim de redução de carga tributária, nos termos do Parágrafo Único do Artigo 116 do CTN, identifica-se ausência de critérios objetivos para se auferir a legalidade do planejamento tributário, especialmente pela deturpação na aplicação da teoria do propósito negocial segundo sua concepção original.


5.    CONCLUSÕES


O planejamento tributário encontra vital importância para o avanço econômico do País, pois, ao restringir a utilização de tal instrumento, fatalmente impõe um freio à força motriz da atividade econômica, considerando a capacidade empresarial de injetar recursos no mercado.


A ausência de critérios objetivos para se auferir a legalidade da reorganização empresarial dentro do planejamento tributário, em virtude da aplicação equivocada da teoria do Propósito Negocial segundo sua concepção original, impõe ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais a tarefa de combater fraudes fiscais, sem prejudicar aqueles que buscam o equilíbrio fiscal de forma licita.


Vale lembrar, que antes de desconstituir a reorganização societária realizada pela Sra. Gregory, no caso Gregory vs. Helvering, o Magistrado Learned Hand “afirmou que o contribuinte tem o direito de organizar seus interesses de modo a suportar a menor carga tributária possível, pois, não é obrigado a escolher a alternativa que conduza ao maior recolhimento de tributos ao Poder Público, já que não há um dever patriótico de aumentar os tributos devidos ao Estado em cada fato gerador”.  Valores que nos remetem ao direito do livre exercício da atividade econômica previsto pelo artigo 170 da Magna Carta, bem como ao direito à livre iniciativa, previsto pelo artigo 3º da nossa Constituição Federal.


Por tal razão, é preciso diferenciar a forma em que a teoria do Proposito Negocial fora aplicada no caso Gregory vs. Helvering, já que, naquela ocasião, a dissolução da empresa logo após incorporar ações que seriam oferecidos em sua integralidade para tributação, retirou a higidez da reorganização empresarial, e, por consequência, sua licitude. Já, nos casos analisados pela jurisprudência do CARF colecionadas no presente artigo, o critério para desconstituição do ato jurídico para desoneração de tributos, ganhou alcance mais amplo e subjetivo, dificultando o conceito de licitude do planejamento tributário.


Neste sentido, a mudança do paradigma jurisprudencial do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais é necessária para adequação da Teoria do Propósito Negocial, sem desvirtuar sua concepção original.


REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS


Ivo Cesar Barreto de Carvalho, “Planejamento Tributário”, in Hugo de Brito Machado (coord.), Planejamento Tributário, São Paulo: Malheiros: ICET, 2016.


José Eduardo Soares de Melo, “Planejamento Tributário”, in Hugo de Brito Machado (coord.), Planejamento Tributário, São Paulo: Malheiros: ICET, 2016.


SANTOS, Ramon Tomazela. O desvirtuamento da teoria do propósito negocial: da origem no caso Gregory vs. Helvering até a sua aplicação no ordenamento jurídico brasileiro. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (Coord.). Revista Dialética de Direito Tributário - RDDT. São Paulo: Editora Dialética, n. 243, Dezembro/2015.


Torres, Ricardo Lobo. Normas Gerais Antielisivas. Revista Fórum de Direito Tributário – RFDT, Belo Horizonte, n.1, jan/fev. 2003.


[1] Torres, Ricardo Lobo. Normas Gerais Antielisivas. Revista Fórum de Direito Tributário – RFDT, Belo Horizonte, n.1, jan/fev. 2003, p. 90 – 123.


[2] Ivo Cesar Barreto de Carvalho, “Planejamento Tributário”, in Hugo de Brito Machado (coord.), Planejamento Tributário, São Paulo: Malheiros: ICET, 2016, p.300. 

 

[3] José Eduardo Soares de Melo, “Planejamento Tributário”, in Hugo de Brito Machado (coord.), Planejamento Tributário, São Paulo: Malheiros: ICET, 2016, p.360.  


[4] SANTOS, Ramon Tomazela. O desvirtuamento da teoria do propósito negocial: da origem no caso Gregory vs. Helvering até a sua aplicação no ordenamento jurídico brasileiro. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (Coord.). Revista Dialética de Direito Tributário - RDDT. São Paulo: Editora Dialética, n. 243, p. 126-145, Dezembro/2015.


[5] Op. Cit . A decisão não entra no mérito das diversas correntes teóricas a respeito do conceito de pessoa jurídica, como organismo natural, centro de imputação, realidade, ficção, entre outras. Para uma análise do tema, conferir: FERRAZ JR., Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do Direito. 8ª Edição. São Paulo: Atlas, 2015. Pp. 120-123.


[6] Idem. Op Cit. Sem entrar no mérito, aqui, acerca da possibilidade, ou não, de simulação de sociedades. Sobre o tema, vide: ANDRADE JÚNIOR, Luiz Carlos de. A simulação no Código Civil. Tese de Doutorado. São Paulo: USP, 2014. pp. 201-213.


[7] Ibidem. Op. Cit. Nas palavras de Learned Hand: “Any one may so arrenge his affairs that his tax shall be as lows as possible; he is not bound to choose that pattern which will best pay for treasury: there is not even a patriotic duty to increase one´s taxes”. (Gregory vs. Heaving. 69 F.2d 809, 810 (2d Cir. 1934). 

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