1. Introdução
No dia 20 de março foi aprovado o PLS 429/17, em caráter terminativo pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal, projeto esse, que trata das alterações na Leis dos Partidos Políticos, e dentre essas, o dever das agremiações político-partidárias de preverem, em seus estatutos, Programas de Integridade.
As polêmicas sobre a autonomia partidária tal como concebida pela Constituição de 1988 e a real necessidade dos Programas de Integridade como instrumento de combate a corrupção já dividem opiniões.
Nesse sentido, o presente artigo pretende apresentar o compliance eleitoral e demonstrar que os Programas de Integridade podem ser, na verdade, a via conciliatória.
Nos termos da justificativa no projeto temos que:
“A área de compliance (integridade) no Brasil ganhou contornos jurídicos com o advento da Lei nº 12.846, de 2013, conhecida como a Lei Anticorrupção, bem como do seu Decreto regulamentador nº 8.420, de 2015, e a tendência é que o incentivo pela sua aplicação se estenda também aos partidos políticos. No plano internacional, vale mencionar que os mandamentos do art. 7, alínea 3, e do art. 26, alíneas 1 a 4, da Convenção das Nações Unidades para o Combate à Corrupção (CNUCC), retificada e promulgada no Brasil, nos termos do Decreto nº 5.687, de 31 de janeiro de 2006, já previam diretrizes para a responsabilização de pessoas jurídicas e a necessidade de aumentar-se a transparência relativa ao financiamento de partidos políticos e de candidaturas a cargos públicos eletivos. Como qualquer pessoa jurídica, os partidos políticos também devem ter procedimentos e controles robustos, baseados nas melhores práticas nacionais e internacionais, a fim de evitar irregularidades e ilícitos – principalmente por lidarem com recursos públicos.”
Ou seja, as agremiações político-partidárias devem seguir as mesmas regras das demais pessoas jurídicas nacionais: evitar fraudes, combater a corrupção, fazer valer aos tratados internacionais aos quais o país é signatário com conformidade e transparência.
Se estar em “compliance” é estar e conformidade com leis e regulamentos nacionais e internacionais, estar em compliance eleitoral, seria primeiramente, estar em conformidade com as normas eleitorais, partidárias, mas como também aquelas que regem as pessoas jurídicas, a qual se inclui a Lei Anticorrupção.
A Lei 12.846/2013, conhecida como Lei Anticorrupção, era primordialmente denominada de Lei da Empresa Limpa e no seu arcabouço há alguns que devem ser destacados: i. Processo Administrativo de Responsabilização da Pessoa Jurídica; ii. Responsabilidade por Abuso de Sociedade; iii. Atenuantes na aplicação da multa por comprovado ato lesivo: Efetivo Programa de Compliance/Integridade e Acordo de Leniência.[1]
O Decreto 8420/2013, que regulamenta a Lei Anticorrupção elenca eu seu art. 42 como deve ser o referido Programa de Integridade e isso vale para “qualquer pessoa jurídica” (vide art.1º, parágrafo único da LAC), portanto, dar tratamento diferenciado as agremiações político partidárias no que diz respeito ao dever de implementar Programas de Integridade fere o princípio da isonomia e não sua autonomia conferida pela Constituição e por todos esses motivos, entendemos que o PLS 429/2017 deve ser aprovado.
2. Compliance Eleitoral – Fases de Campanha Eleitoral
Com essa breve explicação, a doutrina que trata do Direito e Compliance Eleitoral entende que este deve ser tratado em quatro fases: pré-campanha; durante a campanha; pós – campanha e na prestação de contas.
Na prática, o objetivo do Compliance Eleitoral é verificar as potencialidades e vulnerabilidades de uma campanha, voltadas ao mapeamento de riscos, controlar as vulnerabilidades dos candidatos, manter a conformidade existente e ajustar à legislação a conformidade que falta.
Em pré-campanha é feita a “escolha dos candidatos” e na conformidade legal se encontra na busca do preenchimento dos requisitos formais, quais sejam as “condições de elegibilidade definidas na Constituição.
Por conseguinte, a análise dos impedimentos, pois os candidatos não podem ferir nenhuma das situações dispostas na LC 64/90, nos critérios da Lei 9.504/97, além dos critérios de inelegibilidades dispostas na Constituição.
Como mencionado anteriormente, neste ponto a principal ferramenta utilizada é o mapeamento dos riscos, para se ter um diagnóstico objetivo, um panorama geral sobre as campanhas adversárias para utilizar s informações com cunho estratégico, com essas duas vertentes de atuação: candidatura do próprio partido e dos partidos adversários. Um otimiza um otimiza o capital político que o partido já possui e o outro pode retirar concorrentes politicamente fortes e se não for possível substituir por outros de semelhante força. [2]
Em campanha a sugestão é criar um mapa com fases do calendário eleitoral definido pelo TSE e o supramencionado mapeamento seria em resumo em sete fases: viabilidade jurídica das candidaturas; Convenções partidárias; Registros e Impugnações de candidaturas; Propaganda eleitoral; Dia das eleições; Prestação de Contas e Atos de diplomação e posse.
Nesta fase o objetivo é ter o maior controle possível da campanha.
Muitos que acompanham esta leitura dirão: “mas nós já fazemos isso”. Pois é. Estar em compliance é uma prática, e uma ferramenta de gestão estratégica que utilizamos, mas sem mencionar essa nomenclatura.
3. Período Pós – Campanha e Contencioso Judicial Eleitoral
O período que sucede o dia das eleições deve ser bem monitorado, pois nesse período além da prestação de contas, remanescem ações judiciais decorrentes da eleição e aquelas que só podem ser propostas ou impetradas após o dia da eleição.
Dentre as ações judiciais, podemos destacar: Representações; AIRC (Ação de Impugnação de Registro de Candidatura); AIJE (Ação de Investigação Judicial Eleitoral); AIME (Ação de Impugnação de Mandato Eletivo); RCED (Recurso contra Expedição de Diploma); Ação Rescisória Eleitoral...[3]
Com efeito, o compliance eleitoral nesta fase permite uma análise estratégica e objetiva da conduta e com metodologia de checagem e gestão, pois os prazos na Justiça Eleitoral são diferenciados. Por isso, o “plano estratégico de conformidade jurídica” evita erros que possam servir de vulnerabilidades ao candidato assessorado, bem como no embate com adversários.
4. Os Benefícios de se ter um Programa de Integridade e a Prestação de Contas
A decisão do STF na ADI 4650 proibiu o financiamento empresarial de campanhas e desde as eleições de 2018 vale a vedação.
A proposta de um compliance eleitoral, sugere estabelecer os parâmetros de arrecadação de recursos financeiros de modo lícito pois a agremiação político - partidária que possui um Programa de Integridade pode demonstrar no processo de Prestação de Contas (assim como num PAR), que usou de todos os métodos possíveis dentro da pessoa jurídica não só para combater a corrupção, mas como para evitar fraudes e melhorar seus processos internos.
Um Programa de Integridade nos termos dos art. 41 e 42 do Decreto 8420/2015, consiste:
“Art. 41. Para fins do disposto neste Decreto, programa de integridade consiste, no âmbito de uma pessoa jurídica, no conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes com objetivo de detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira.
Art. 42. Para fins do disposto no § 4o do art. 5o, o programa de integridade será avaliado, quanto a sua existência e aplicação, de acordo com os seguintes parâmetros:
I - comprometimento da alta direção da pessoa jurídica, incluídos os conselhos, evidenciado pelo apoio visível e inequívoco ao programa;
II - padrões de conduta, código de ética, políticas e procedimentos de integridade, aplicáveis a todos os empregados e administradores, independentemente de cargo ou função exercidos;
III - padrões de conduta, código de ética e políticas de integridade estendidas, quando necessário, a terceiros, tais como, fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários e associados;
IV - treinamentos periódicos sobre o programa de integridade;
V - análise periódica de riscos para realizar adaptações necessárias ao programa de integridade;
VI - registros contábeis que reflitam de forma completa e precisa as transações da pessoa jurídica;
VII - controles internos que assegurem a pronta elaboração e confiabilidade de relatórios e demonstrações financeiros da pessoa jurídica;
VIII - procedimentos específicos para prevenir fraudes e ilícitos no âmbito de processos licitatórios, na execução de contratos administrativos ou em qualquer interação com o setor público, ainda que intermediada por terceiros, tal como pagamento de tributos, sujeição a fiscalizações, ou obtenção de autorizações, licenças, permissões e certidões;
IX - independência, estrutura e autoridade da instância interna responsável pela aplicação do programa de integridade e fiscalização de seu cumprimento;
X - canais de denúncia de irregularidades, abertos e amplamente divulgados a funcionários e terceiros, e de mecanismos destinados à proteção de denunciantes de boa-fé;
XI - medidas disciplinares em caso de violação do programa de integridade;
XII - procedimentos que assegurem a pronta interrupção de irregularidades ou infrações detectadas e a tempestiva remediação dos danos gerados;
XIII - diligências apropriadas para contratação e, conforme o caso, supervisão, de terceiros, tais como, fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários e associados;
XIV - verificação, durante os processos de fusões, aquisições e reestruturações societárias, do cometimento de irregularidades ou ilícitos ou da existência de vulnerabilidades nas pessoas jurídicas envolvidas;
XV - monitoramento contínuo do programa de integridade visando seu aperfeiçoamento na prevenção, detecção e combate à ocorrência dos atos lesivos previstos no art. 5o da Lei no 12.846, de 2013; e
XVI - transparência da pessoa jurídica quanto a doações para candidatos e partidos políticos.
Ou seja, o partido político que possui “programa de compliance” se organiza e se estrutura para todas as fases de uma eleição atingindo essa ferramenta sua maturidade de gestão, plano estratégico e ainda a sua função social.
5. Conclusões
O referido PLS 429/2017 sugere que os partidos políticos estejam em “conformidade” com as regras já exigidas dos demais entes públicos e pessoas jurídicas e o compliance eleitoral vem, nesse sentido como metodologia na implementação dessa cultura de conformidade. Não pode ser considerada, portanto “uma regra incômoda”.
Os Programas de Integridade ao nosso ver, são ferramentas metodológicas para implementar compliance nas empresas e, por conseguinte uma “cultura de conformidade”, e seu objetivo, através dessas boas práticas é o combate a corrupção, prevenção a fraudes e melhoria continuada de processos internos.
Para os Partidos Políticos o compliance eleitoral pode colabora em todo processo eleitoral, pois uma campanha bem-feita tem começo, meio, fim e por vezes prestação de contas.
[1] FRAZÃO, ANA. Compliance: perspectivas e desafios dos programas de conformidade / Ricardo Villas Bôas Cueva, Ana Frazão (Coord.). – Belo Horizonte : Fórum, 2018.
[2] BARBOSA, Narciso Fernandes. O compliance como instrumento de prevenção e combate à corrupção. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2017. Pagina, 26
[3] NETO, Tarcísio Vieira de Carvalho; FERREIRA, Telson Luis Cavalcante. (coord). Direito Eleitoral – Aspectos Materiais e Processuais. Brasília: Migalhas. 2016.
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